Salazar ao lado de Cristiano Ronaldo e craques da Seleção Brasileira Vini Jr, Militão e Rodrygo (Foto: Arquivo pessoal)
Marcelo Salazar quando jogava futsal era conhecido como Marcelinho. Em 2011, assinou um contrato de dois anos com o Al Arabi, do Kuwait. Jogou até 2012, mas queria buscar outras experiências. Formado em educação física, começou a trabalhar em uma faculdade do Kuwait como treinador de futebol de campo. Sempre que tinha um tempo, voltava ao Brasil para tirar as licenças expedidas pela CBF. Em 2016, deu seus primeiros passos no campo, sendo preparador físico do Al Shabab. O título nacional abriu as portas. O técnico Péricles Chamusca queria ele como seu assistente no Al Faisaly, da Arábia Saudita. Três temporadas e títulos chamaram a atenção de outros clubes. O técnico Mano Menezes comandava o Al Nassr e ele seguiu para lá. Mas o trabalho de Marcelo chamou a atenção dos dirigentes do clube.
Em janeiro de 2022, se tornou Diretor Executivo de Futebol do Al Nassr., time do astro português Cristiano Ronaldo. Na próxima temporada, Marcelo Salazar vai ficar responsável pela área de recrutamento de jogadores, também ficará ligado ao monitoramento de possíveis reforços, análises dos jogadores emprestados e, claro, com seu olhar atento às divisões de base. Além de ser treinador licenciado, Marcelo Salazar fala cinco idiomas e tem um conhecimento do futebol árabe como poucos estrangeiros.
Ser o executivo de futebol de um dos clubes mais fortes da Saudi Pro League é motivo de orgulho do pernambucano, que foi um dos responsáveis pelo boom do futebol por todo o Mundo. Em entrevista ao Diario de Pernambuco, Marcelo conta sobre o início no mundo árabe, o crescimento dos clubes da Arábia Saudita, as semelhanças com o futebol brasileiro e o que esperar para os próximos anos.
Salazar construiu bela carreira na Arábia Saudita (Foto: Arquivo pessoal)
DIARIO DE PERNAMBUCO - Marcelo, como você chegou ao futebol árabe?
MARCELO SALAZAR – Em janeiro de 2011, quando ainda jogava futsal profissionalmente,
assinei um contrato de dois anos com o Al Arabi, do Kuwait. Parei de jogar em setembro de
2012. Comecei imediatamente a trabalhar numa Universidade como treinador de futebol, fiz
todas as licenças da CBF (C, B, A e PRO). Em 2016, comecei como preparador físico no Al
Shabab, ainda no Kuwait. Depois de ser campeão do Campeonato Kuwaitiano, recebi o convite do técnico Péricles Chamusca para ser seu assistente no Al Faisaly, da Arábia Saudita. Trabalhamos juntos por três temporadas e fomos campeões da Copa do Rei em 2021. Logo após, recebi o convite para ir para o Al Nassr, que era dirigido na ocasião por Mano Menezes, onde estou desde então.
DP – Como analisa a ascensão do futebol árabe, com tantos investimentos sendo feitos e
atraindo astros do futebol? Particularmente, esperava um crescimento tão rápido?
MS – O investimento no futebol faz parte de uma estratégia muito maior, liderada pelo
príncipe herdeiro do Reino da Arábia Saudita, Mohamed Bin Salman, que é a “Saudi Vision
2030”. Futebol traz muita visibilidade. Arábia Saudita é um país apaixonado pelo futebol, que sempre investiu no esporte, mas confesso que não esperava uma mudança tão brusca quanto a que ocorreu desde a chegada do Cristiano Ronaldo ao Al Nassr, em janeiro de 2023.
DP – Acredita que o futebol árabe tem potencial para se transformar em uma das maiores
ligas mundiais pelo poder de investimento que tem?
MS – Vai depender dos critérios para determinar “as maiores ligas mundiais”. O que é certo é que o futebol árabe hoje é visto nos quatro cantos do Planeta, e o nível é alto.
DP – O futebol chinês também veio com muita força, mas acabou se perdendo. Existe algum perigo do futebol árabe de replicar uma experiência mal sucedida do país oriental?
MS – Não vejo esse perigo. Como eu disse antes, o futebol é parte de um megaprojeto
nacional. Arábia Saudita é um país com tradição no futebol. Vale lembrar que a Copa do
Mundo de 2034 será aqui.
DP – Como o povo árabe está reagindo a este crescimento do futebol? Eles são fanáticos
como nós, brasileiros?
MS – Tanto quanto. O futebol domina as discussões tanto na vida real quanto nas redes
sociais. A rivalidade é acirrada, mas não violenta. Temos jogos com mais de 60 mil
torcedores. O futebol também é jogado em campos de terra. São muitas as semelhanças com o Brasil.
Salazar se adaptou aos costumes árabes (Foto: Arquivo pessoal)
DP – Fala-se muito que esse boom inicial deve atrair mais investidores para o futebol. Existe possibilidade de novos players apostando neste novo negócio?
MS – Até o momento o grande investidor é o próprio governo, através do PIF (Public
investment fund, ou fundo de investimento soberano) e suas empresas. Qualquer negócio de sucesso atrai novos jogadores dispostos a entrar no jogo.
DP – Nestes primeiros campeonatos, a competição ficou concentrada em Al-Nassr, Al Ittihad, Al-Hilal e Al-Ahli, que ficaram muito à frente dos demais, turbinadas pelo dinheiro do fundo de investimento do governo. Tem como nivelar mais a competição?
MS – Não é só dinheiro. Veja que o Al Taawoun, que foi treinado pelo Péricles Chamusca, ficou à frente do Ittihad, de Benzema, Fabinho, Marcelo Gallardo e cia. E também de outros com orçamento bem maior, como Ettifaq, treinado pelo astro inglês Steven Gerrard. Agora, no mundo inteiro, em qualquer ramo de negócio (incluindo aí tanto o futebol, quanto o esporte de maneira geral), quem tem mais dinheiro, via de regra contrata os melhores e tem mais chances de ficar à frente daqueles com menor poder financeiro.
DP – Trazer mais ídolos do futebol para o campeonato do país acaba sendo o desejo dos
dirigentes, mas seria preciso mudar a estrutura da Arábia Saudita. O que precisa ser feito?
MS – Hoje podem ser inscritos até dez estrangeiros, entre eles oito não tem limite de idade e dois têm que ter nascido de 2003 em diante.
DP – Novas divisões e o futebol de base também precisam ser olhados com mais carinho, até para que a Arábia Saudita possa se tornar uma força mundial. Existe algum planejamento para isso?
MS – Sim. Na temporada 25/26 deve ser criada a liga reserva (Sub-23) e já nessa temporada 24/25, vamos ter campeonatos para cada ano (Sub-18, Sub-17, Sub-16…). Já está sendo feito o trabalho com a geração que representará o país no Mundial de 2034.
DP – O que o futebol brasileiro pode aprender com o futebol árabe e que lições podemos
levar para eles?
MS – Apesar de haver semelhanças, também há muitas diferenças. Eu vejo o modelo árabe
como único. Ainda carece de uma maior profissionalização nas áreas afins (administrativo,
legal, comercial, logística, infraestrutura de estádios, melhorar a experiência do torcedor, etc). No Brasil, eu apontaria quatro grandes áreas de melhoria: profissionalização/qualificação dos dirigentes, qualidade dos gramados; qualidade da arbitragem; e calendário.