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DIA INTERNACIONAL CONTRA A HOMOFOBIA, TRANSFOBIA E BIFOBIA

Contra a lgbtfobia, torcidas se movimentam pedindo inclusão e respeito no futebol

Público LGBTQIA ainda sofre ameaças e violência no espaço do futebol, mas, com ações de clubes, federações e governos, pode haver inclusão

postado em 17/05/2021 19:10 / atualizado em 17/05/2021 23:05

<i>(Foto: Acervo pessoal)</i>
No dia 17 de maio de 1990, a comunidade LGBT teve uma das suas primeiras grandes vitórias, quando a OMS parou de considerar a homossexualidade como distúrbio mental. Aquilo era  o início da árdua luta celebrada todo 17 de maio, no Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia. No futebol, o ambiente segue hostil, mas as pequenas vitórias têm impulsionado a força dos movimentos LGBTQIA+ que se fazem presentes nos estádios.

Do Trio de Ferro do Recife, dois times já têm torcidas LGBT, com a Sport Recife LGBTQ e a Coral Pride. No Náutico, mesmo sem a representação “oficial”, a luta por inclusão também está presente. Em união, os três clubes soltaram, nesta segunda-feira, uma nota, se posicionando contra a lgbtfobia e clamando por respeito. Esse posicionamento, porém, não pode ficar só no discurso, como alertou June Ellen, integrante da Coral Pride, do Santa.

"São pequenos passos perante o que a gente quer ver um dia, não só o Santa Cruz fazendo, mas todos os clubes. Neste ano, tivemos a primeira comissão de inclusão e diversidade do clube, que já atuou em conjunto ao Centro Estadual de Combate à Homofobia (CECH) para realizar uma formação com alguns funcionários do clube, inclusive com o presidente (do Santa) presente (...) Ainda é preciso fazer mais para combater a discriminação, seja por gênero, cor ou orientação sexual. Tenho um lema que adaptei de um companheiro de luta e de arquibancada 'Ame o Santa Cruz e odeie o preconceito', salientou June.

Para ela, isso precisa ser feito para que o futebol deixe de ser um “ambiente hostil” para esse público. O Brasil está entre os países mais violentos do mundo para a população LGBTQIA . Segundo o Trans Murder Monitoring (Observatório de Assassinatos Trans), nos primeiros nove meses de 2020, 124 pessoas transexuais foram mortas no Brasil, o que coloca o país como o mais violento para pessoas trans pelo 12º ano consecutivo.

"Quando a gente fala que o futebol, o estádio é um ambiente hostil, é porque ele é um lugar que é completamente predominado por homens, na sua maioria, héteros, que se sentem donos desse local, que eles pertencem àquele local e nada mais pode ser pertencente daquele espaço. Nem mulheres, LGBTs e por aí vai. Um ambiente hostil, que a gente fala, é quando a gente vê cânticos de torcidas com o teor machista, racista, lgbtfóbicos (...) O estádio é violento para as minorias, que não são minorias de fato”, disse.

June também aponta que o ativismo LGBT dentro do meio machista do futebol também é alvo de manifestações contrárias e até ameaças. “A gente já recebeu diversas ameaças de que, se fosse para o estádio, ia apanhar (..) Nossos corpos são muito frágeis nesse espaço, porque foram acostumados geração por geração, a sociedade construiu que LGBTQIA não existe, não pode existir, você não pode ser LGBT, você não pode dizer, você não pode transparecer. E isso em nenhum espaço, mas no futebol fica ainda mais forte isso”.

<i>(Foto: Sandy James/DP Foto)</i>
Dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), referência no estudo de violência contra LGBTs no Brasil, apontam que, em 2019, ocorreram 339 mortes violentas de lésbicas, gays, travestis e transexuais em todo o país, sendo 24 deles aqui em Pernambuco.  

"As pessoas acham que esses cantos, essas 'brincadeiras' que não são brincadeiras, não fazem nada. Faz sim, só que essas pessoas não sentem na pele, não veem. Aquilo transcende o futebol. Pessoas morrem por conta disso. 'Ah, mas que exagero', não é exagero, porque vai enraizando tanto, vai se justificando tanto aqueles termos, aquelas atitudes, que tem pessoas que realmente odeiam, que agridem verbalmente, fisicamente”.

“O futebol é muito do povo, da massa, faz parte da nossa cultura. Através dele acontecem mudanças. Então, se a gente começa a dar passos de mudança nesse espaço, a gente consegue levar isso para outros lugares”, afirmou a torcedora.

ORGULHO CORAL

<i>(Foto: Acervo pessoal)</i>
Sobre a Coral Pride, especificamente, June explicou um pouco do que é essa torcida e quais são os seus objetivos, apontando a busca por trabalhar com ações afirmativas no contexto do futebol, em defesa dos que têm menos vez e voz na sociedade. 

"A Coral Pride é um grupo e junção de torcedores LGBTQIA apaixonados pelo Santa Cruz que resolveram se juntar tanto para torcer pelo clube, mas também para cobrar que o clube comece a trabalhar ações afirmativas, tocando nesses temas de combate a lgbtfobia no futebol. O nosso objetivo é pautar a nossa existência e resistência nesses espaços que ainda é muito predominado pelo preconceito, nisso incluindo questões de racismo e machismo também".

Integrando a torcida LGBT daquele que se orgulha em chamar de “clube do povo”, June também pediu para que o Santa Cruz não se esqueça do real significado dessa alcunha.

"Acho importante e necessário que os clubes não parem, principalmente o Santa Cruz. Se a gente vê a história da origem do clube, partiu da inclusão, de cor, gênero, orientação sexual, classe social e por aí vai. O Santa Cruz tem, como dever, continuar a honrar sua história, que faz muitos se apaixonarem pelo clube, por ter essa diferença dos rivais. Então queria reforçar que o Santa Cruz nunca fuja da sua história e siga sendo mais que um clube, sendo também uma ferramenta de mudança no futebol e no social".

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