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ESPECIAL "CLÁSSICOS QUE DEFINIRAM"

Há 30 anos, Sport vencia o Náutico e conquistava o Pernambucano com roteiro parecido da finalíssima deste domingo

Na ida, a partida terminou empatada; na volta, Moura e Hélio decidiram

postado em 19/05/2021 02:45 / atualizado em 19/05/2021 03:42

<i>(Foto: Reprodução/TV Globo
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É semana de decisão em Pernambuco. Além de definir o vencedor do 107º Campeonato Pernambucano, a finalíssima deste domingo será disputada entre Náutico e Sport - e, embora seja de notoriedade pública, isso faz toda a diferença. Na história do certame, os arquirrivais decidiram 18 decisões estaduais. Entre finais com o modelo ‘melhor de três’, como a primeira da história, em 1951, vencida pelo Timbu, e outras definidas no ‘tie-break’, tal qual a de 1975, conquistada pelo Leão, seis taças foram levantadas pelo clube da Rosa e Silva, enquanto as outras 12 pelo da Abdias de Carvalho.

O roteiro da 19ª finalíssima estadual entre as equipes, no entanto, é inédito em 30 anos. 

A última vez que o Clássico dos Clássicos definiu um Pernambucano no formato ‘ida e volta’ com tudo igual na primeira partida foi em 1991, quando os adversários empataram, no Arruda, em 3 a 3. Uma semana depois, o Rubro-negro confirmou o favoritismo e venceu, na Ilha do Retiro, por 3 a 0 o jogo da volta - assim, alcançou a 26ª taça estadual de sua história.

De lá para cá, sendo o último em 2019, cinco dos 18 Clássicos dos Clássicos que decidiram o Campeonato Pernambucano na história foram disputados - com 100% de aproveitamento do Sport no recorte. 

Para relembrar parte da história do terceiro clássico mais antigo do Brasil, o Diario de Pernambuco preparou o especial ‘Clássicos que Definiram’ para resgatar a crônica de cinco jogos entre Sport e Náutico que decidiram os Campeonatos Pernambucanos a partir das páginas do jornal mais antigo da América Latina e, evidentemente, aquecer o clima do embate decisivo deste domingo (23).

No decorrer da semana, recordaremos a primeira final da história entre os clubes, em 1951, a do hexacampeonato alvirrubro, em 1968, a de 1975, quando o Sport rompeu o jejum de 12 anos sem títulos, e a última realizada na história, em 2019.

Nesta primeira edição do especial ‘Clássicos que Definiram’, iremos recapitular o embate histórico de 1991 - cujo roteiro, 30 anos depois, se assemelha ao de 2021. 

O PRIMEIRO JOGO
 
<i>(Foto: Reprodução/TV Globo)</i>
1991 foi um ano, sobretudo, histórico. Nele, Ayrton Senna conquistou o tricampeonato da Fórmula 1, o fogo da Guerra do Golfo foi cessado e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) foi declarada oficialmente extinta. Diante do cenário efervescente da época, Sport e Náutico disputavam, entre 8 e 15 de dezembro, a finalíssima do Campeonato Pernambucano.

Com a melhor campanha do estadual, o Sport ostentava um retrospecto invejável. Em 30 jogos, somava, além de 87 gols anotados, 24 vitórias, dois empates e quatro derrotas: 83,3% de aproveitamento. Dessa maneira, bastava dois empates na finalíssima para o Leão da Ilha levantar o caneco. 

Do outro lado, o Náutico também não fazia feio. Sob o comando de Gilson Nunes, ex-ponta esquerda de Fluminense, América-RJ e Vasco, o Timbu havia conquistado 72,2% dos pontos disputados até a decisão e vinha de vitória por 1 a 0 no último clássico realizado contra o Sport.

Era o confronto das duas melhores campanhas do torneio e dos melhores times pernambucanos à época. Diante de um dos maiores Clássicos dos Clássicos da história, o Náutico optou por levar o embate de ida ao Arruda, que tinha capacidade para 110.000 torcedores. Naquele 8 de dezembro de 1991, um dos jogos mais emblemáticos da história do Campeonato Pernambucano estava prestes a começar. 
 
<i>(Foto: Acervo/Diario de PE)</i>

Com Givanildo Oliveira à beira do gramado, o visitante Sport contava com dois ídolos remanescentes do título nacional de 1987. Neco e Zico, que estiveram em campo na final contra o Guarani-SP três anos antes, dividiam, naquela tarde, time com Gilberto; Givaldo, Ailton, Chico Monte Alegre e Silvio Santos; Dinho e Ataíde. Além, é claro, da dupla que, somada, foi responsável diretamente por mais de 50 gols do Leão naquele estadual: Moura, ‘o Príncipe Negro’, e Hélio, ‘o Doido’.

Pelos mandantes, Gilson Nunes, hoje com 74 anos, destaque para o ídolo alvirrubro Lúcio Surubim, que estava posicionado na cabeça de área do Timbu. Ao lado dele, Mauri; Cafezinho, Freitas, Isaias e Felício; Batista e Possi; Nivaldo, Dinda e Fabinho completavam o escrete vermelho e branco.

Com o apito inicial do juiz Armando Costa Filho, as duas equipes se lançaram ao ataque e demonstraram, ainda nos primeiros minutos, do que se tratava o jogo de ida da final do Campeonato Pernambucano. Com a vaidade da melhor campanha e o maior goleador do certame, o atacante Moura, que terminou o estadual com 26 gols, o Leão da Ilha do Retiro esboçou as melhores chances e logo tomou as rédeas da partida. 

Apesar disso, os mandantes, que estavam retraídos em seu campo, apostaram na eficiência para abrir o placar no Arruda. E, aos 31 minutos, Dinda, que tinha apenas 18 anos, se livrou do zagueiro leonino Chico Monte Alegre e encontrou Carlinhos, livre. Substituto de Nivaldo, que havia precocemente deixado o campo, o alvirrubro driblou magicamente o arqueiro rubro-negro e passou para o zagueiro Freitas balançar as redes do Sport.

A vantagem do Náutico, entretanto, pouco durou. Cerca de dois minutos após a abertura do placar no José do Rego Maciel, Hélio, vice-artilheiro do Leão, aproveitou o cruzamento de Dinho e cabeceou em direção ao gol e estufou as redes defendidas por Mauri. Com tudo igual no Arruda, Armando Costa Filho assinalou o fim da etapa inicial e os jogadores se dirigiram ao vestiário.
 
<i>(Foto: Reprodução/TV Globo)</i>
No segundo tempo, a intensidade do clássico permaneceu a mesma da etapa anterior - com destaque para os comandados de Givanildo Oliveira, que, aos 10 minutos, viraram o jogo. Em passe vertical de Moura, que ensinou Juninho Pernambucano a cobrar falta, o Leão rompeu com as linhas de defesa do Timbu e encontrou Hélio para confirmar o domínio apresentado nos instantes iniciais da etapa final. Com categoria única, ‘o Doido’ encobriu Mauri e anotou um gol de placa - a dupla de ataque rubro-negra, de fato, não era fraca. 

Embalado pelo frevo que tocava nas arquibancadas do Arruda, o Sport, em mais uma jogada dos inspirados atacantes, aumentou a vantagem. Agora, ao invés: com passe de Hélio, Moura - e seu faro goleador - ‘encaminhou’ a vitória leonina. O 3 a 1 parecia tranquilizar os leões, que festejavam e gritavam ‘olé’ nas tribunas do estádio. Parecia.

Por volta dos 30 minutos, o zagueiro Freitas, autor do gol timbu, se atirou ao ataque e passou para Cafezinho, um dos destaques do escrete durante o campeonato, que cruzou para Fabinho diminuir o placar. Diante de 40 mil torcedores, o desenlace do confronto de ida da final do Campeonato Pernambucano foi de pura emoção. Tendo em vista o cenário dentro de campo, o treinador Gilson Nunes optou por deixar de lado a tática e partir para cima do time que tinha o ataque mais letal do certame.

E, quando tudo parecia improvável, quis o destino estragar a festa antecipada do Sport. Da zona de segurança do Timbu, nasceu a jogada do tento impossível. Com uma visão de poucos, Felício lançou para o iluminado Freitas - que, naquela altura do campeonato, de zagueiro só tinha a numeração nas costas - dominar no peito, cortar o marcador rubro-negro e fuzilar as redes defendidas por Gilberto. 

Era o último lance do jogo que terminou empatado e com festejo da torcida alvirrubra. A volta do dia 15 de dezembro de 1991 tomava ares épicos.

ENFIM, OS 90 MINUTOS FINAIS
 
<i>(Foto: Reprodução/TV Globo)</i>
 Restavam poucos minutos para o início do último jogo do Campeonato Pernambucano de 1991 e as imediações da Ilha do Retiro estavam completamente congestionadas. Não de carros, como se encontra frequentemente pela Avenida Abdias de Carvalho nos dias de hoje. A aglomeração era formada, portanto, por milhares de torcedores ansiosos pelo Clássico dos Clássicos decisivo daquela tarde.

Dentro do caldeirão rubro-negro, 45.697 pessoas testemunharam a partida de volta da final. Era tanta gente que a estrutura do Adelmar da Costa Carvalho aparentava, por tamanha tremedeira nas arquibancadas, estar na rota de alguma falha geológica. Apesar disso, fora do estádio era apenas mais uma tarde ensolarada no Recife.

Entre rolos de papel higiênico e muita fumaça, a torcida do Sport celebrava a entrada do Leão. Em relação ao escrete que havia iniciado o embate anterior, nenhuma mudança - Givanildo Oliveira apostou na constância de seus comandados e, é claro, na eficiência da dupla Hélio e Moura. Curiosamente, o time de Gilson Nunes também era o mesmo da ida.

Com a autorização do saudoso árbitro Aristóteles Cantalice, que, vítima da Covid-19, morreu em dezembro do ano passado, a bola rolou na Ilha do Retiro. Seguindo a tônica do confronto no Arruda, muita intensidade foi apresentada por ambas equipes no decorrer dos minutos iniciais. 

<i>(Foto: Reprodução/TV Globo)</i>
Enquanto o Náutico aguardava por um contra-ataque definidor, o Sport controlava as ações da partida e buscava encurralar a saída de bola alvirrubra para abrir o placar.

Assim, aos 25 minutos, o Leão trocava figurinhas e passes no campo adversário como quem sabia o que queria. De Zico para Moura para Dinho para Ataíde - todo envolvimento tinha endereço. Diante da zaga alvirrubra, mas com a bola bem dominada nos pés, o ex-jogador do Santa Cruz resolveu finalizar de longe: a pelota acabou rebatendo no defensor e encontrou o artilheiro Hélio - sua melhor companhia. Impiedoso e muito íntimo dela, o atacante apenas a tirou de Mauri, que sequer ousou sujar o uniforme.

Com o placar aberto na Ilha do Retiro, o Náutico tinha que se superar e virar a partida para conquistar o Pernambucano de 1991 - afinal, como já sabe o leitor, o Sport tinha a vantagem do empate por ter conquistado a melhor campanha geral. Apesar disso, o domínio e ritmo dos mandantes permaneceu até o final da primeira etapa.

No segundo tempo, o treinador Gilson Nunes optou por um time mais aberto e franco para levar mobilidade ao setor de ataque alvirrubro. Mesmo com as entradas de  ngelo e Fabinho, o Timbu não conseguiu impor as propostas ofensivas do comandante e viu o rival, aos 2 minutos, ampliar a vantagem. 

Em lance que iniciou na defesa rubro-negra, Moura roubou a bola, acionou seu companheiro Hélio e ativou o modo Linford Christie, velocista e medalhista de ouro nas Olímpiadas de Barcelona, em 1992, na prova de 100 metros. Com o campo aberto, correu mais da metade do gramado da Ilha do Retiro para receber, solto, a bola que terminaria no fundo das redes do Náutico.

Embora o título estivesse ‘nas mãos’ do Sport, a ampla vantagem rubro-negra pouco importava para o treinador Givanildo Oliveira. Era questão de tempo para o Leão levantar a sua 26ª taça do Campeonato Pernambucano, porém o Rei do Acesso queria mais. Inquieto à beira do gramado, o comandante ordenava maior vontade dos seus comandados - que responderam em imediato. 

Fechando o placar do clássico histórico, Hélio recebeu a bola de Moura próximo da entrada da área alvirrubra. De costas, girou rapidamente e surpreendeu o zagueiro Isaías com dois cortes consecutivos. Desmontada a defesa, bastava o chute certeiro - e assim o fez: 3 a 0 e o Sport disparava como o hegemônico de Pernambuco.

    

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