Campo pesado das chuvas atrapalhou o duelo. (Foto: Arquivo/DP)
Em meio aos festejos da inauguração do Estádio do Arruda, Santa Cruz e Flamengo ficaram no 0 a 0 na tarde de 4 de junho de 1972. O resultado, no entanto, se tornou mero detalhe. O abraço da torcida coral nas arquibancadas superou o saldo da bola rolando. Oficialmente, mais de 62 mil pessoas estavam presentes. Mas, segundo registros informais do Diario de Pernambuco, à época, pelo menos outras 20 mil pessoas fizeram parte do primeiro 'formigueiro humano' do Mundão.
Portões de acesso quebrados. Estádio superlotado. Invasão no gramado. A multidão protagonizava o espetáculo. Chegavam milhares de tricolores de toda parte da cidade. Fazer as tradicionais apostas, comprar bandeiras e outros artigos e se agarrar à edição especial preparada pelo Diario, à época, eram os passatempos até a hora do jogo, que só começaria às 15h.
Naquele dia, as cerimônias começaram desde cedo, com missa celebrada pelo Capelão da Polícia Militar, Antônio Alves, e o Monsenhor João Barbalho, irmão de Luis Barbalho, um dos três fundadores ainda vivos à época, junto com Augusto Dornelas e Alexandre Carvalho. O ato teve início exatamente às 9h05, por conta de um atraso no microfone. Antes mesmo da bênção final ser proferida "afim de que aqui, o público só tenha momentos de alegria e nunca de tristeza", a 'algazarra de foguetes' já rolava solta do lado de fora.
O então presidente do clube, James Thorp, hasteou a bandeira como primeiro ato, seguido por shows de ginástica artística e desfiles. Nas arquibancadas, bandeiras e balões dividiam as atenções com os diversos tumultos e invasões de campo. A bola do jogo, arremessada de dentro de um avião que sobrevoava, continha assinaturas de todos os jornalistas da equipe de esportes do Diario de Pernambuco. Enfim, na hora marcada, foi dado o pontapé inicial na 'Colosso'.
O jogo
A peleja mal começou e logo vieram as investidas do ataque mais poderoso já reunido na centenária história do Santa Cruz, com quatro dos que são ainda hoje os seus cinco maiores artilheiros. Atrás apenas de Tará (207 gols), juntos, Luciano Veloso (174), Ramón (148), Betinho (143) e Fernando Santana (123) balançaram as redes 588 vezes com a camisa coral. Alheio ao jogo, o quarteto fazia uma disputa à parte pelo prêmio que seria entregue ao primeiro goleador do novo José do Rego Maciel.
Reunindo as principais referências, exceto pelo lesionado Givanildo Oliveira, o time de Evaristo de Macedo era 'infernal' para o Flamengo do técnico Jouber. Sem as estrelas de Paulo César Cajú, Rogério e Rodrigues Neto, convocados, e ainda o lendário Fio - o Maravilha - no banco, sobrava para Moreira, Chiquinho, Tinho e o jovem estreante Vanderlei, sofrer para conter o time da casa. "Cuidado com esse oito (Luciano), olha ele entrando aí", berrava Jouber. "Vanderlei, cuidado com o ponta (Fernando), esse cara corre muito", ajudava Fio.
Resistindo à pressão, os cariocas também apelavam para as faltas. Numa delas, veio o único grande lance que chegou a tirar o fôlego dos torcedores, tanto nas arquibancadas quanto nos espaços invadidos ao redor do gramado. Dos pés de Fernando Santana, por muito pouco o goleiro Renato evitou o que seria o ápice da euforia daquele dia.
Segundo tempo
Nos 45 minutos finais, a chuva castigou o gramado do Arruda. E deixou o duelo ainda mais morno. Sem grandes chances, o confronto se desenhou com lentas investidas e com as equipes apostando as fichas na defesa. Do lado rubro-negro, os cariocas até tentavam outros caminhos dentro de campo, mas esbarravam no bom jogo defensivo dos corais. Dessa forma, o time rubro-negro cansou, neutralizando o ímpeto da partida.
Aquele domingo, dia 4 de junho, seria apenas o primeiro dos muitos fins de semana de superlotação no 'Colosso do Arruda'. Meio século depois, o antes pacato bairro do Arruda segue se transformando a cada dia de jogo.
Ficha do jogo
Santa Cruz 0
Detinho; Ferreira, Sapatão, Rivaldo e Cabral (Botinha); Erb e Luciano; Cuíca (Beto), Fernando Santana (Zito), Ramon e Betinho. Técnico: Evaristo de Macedo.
Flamengo 0
Renato; Moreira (Rondinelli), Chiquinho, Tinho e Vanderlei; Zanata e Zé Mário (Liminha); Vicente (Dionísio), Caio (Ademir), Dorval (Fio) e Arilson. Técnico: Joubert.
Hora: 15h
Arbitragem: Sebastião Rufino (PE)
Assistentes: Armindo Tavares e Geraldo Alves (ambos PE)
Público pagante: 57.688 pagantes e renda de Cr$ 193.834,00 (cruzeiros)*
*seriam corrigidos no dia seguinte para 62.185 e Cr$ 223.834,00
Ingressos cobrados na partida
Geral: 3 Cr$
Sócios: 3 Cr$
Arquibancadas: 6 Cr$
Cadeiras: 30 Cr$
Capacidade do estádio apresentada pela Comissão Patrimonial após o jogo (variante de acordo com a 'taxa de conforto')